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Mensagem por Admin Qui Abr 06, 2017 9:40 pm

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Capoeira e escravidão: movimento de resistência versus submissão
Rosa Maria Araújo Simões

Resumo

O presente estudo, baseado na metodologia da sociologia histórica, faz uma análise comparativa entre os autores GENOVESE ( 1988) e REGO (1 968). O primeiro se refere à escravidão negra nos Estados Unidos da América, o segundo, ao jogo de luta dançada denominado capoeira, o qual teve suas origens num Brasil — Colônia, cujo regime era escravocrata. A partir desta análise percebo que há, tanto num como noutro, no que diz respeito ao negro, situações de vida similares que desencadeiam semelhantes formas de luta e de submissão. No caso específico do Brasil, há a origem da capoeira, um movimento corporal de resistência negra.

INTRODUÇÃO

Ao fazer uma leitura sobre a escravidão nos Estados Unidos da América, estudada por Genovese (1988), percebi que muitos dos valores que os escravos possuíam lá, eram presentes nos escravos vindos para o Brasil (o que não é de se espantar, pois eram provenientes do mesmo continente africano). Além disso, pode-se perceber que estes valores, no Brasil, ainda são, de certa forma, transmitidos através do jogo de luta dançada denominado capoeira. Esta capoeira que mostra semelhanças e certas diferenças com relação aos escravos que Genovese (1988) trata, e que nos faz pensar na questão de luta e submissão, e que, por enquanto, posso afirmar, é a da Bahia. Cabe ressaltar que nem toda capoeira na Bahia é igual, cada academia tem suas regras mas, uma coisa os capoeiristas têm em comum: todos afirmam que ela é uma luta pela liberdade. Há alguns grupos porém, que afirmam ser a submissão, a maior e melhor arma utilizada para se lutar. Aqui começa uma reflexão à respeito de "formas de lutar" utilizadas, tanto pelos escravos vindos para o Brasil como os que foram para os Estados Unidos da América, para conseguir sobreviver durante a escravidão e até mesmo após a abolição. Levando em consideração essa questão da "capoeira: luta versus submissão", e ainda, a minha experiência enquanto capoeirista e enquanto pesquisadora, percebo que é imprescindível a utilização de estudos históricos e, tendo em vista que, qualquer relação entre pessoas (sem deixar de lado o fator tempo) sofre sociologia histórica, procurarei fazer uma análise comparativa entre Genovese (1988) e Rego (1968) mas, recorrendo a algum outro autor ou documentário, para justamente me dar uma melhor fundamentação histórica. Já de início, pode-se afirmar que, de certa maneira, tanto Genovese (1988) quanto Rego (1968) falam do "mundo que os escravos criaram", porém, o segundo faz uma abordagem sobre a capoeira enquanto "luta dos escravos" e, por trás disso estará "o mundo que os escravos criaram no Brasil", ou até mesmo, pode-se afirmar, "que foram obrigados a criar".

ORIGEM DA CAPOEIRA: A "INTRODUÇÃO" DO NEGRO NO BRASIL

No intuito de proporcionar um breve contexto sócio-histórico sobre a origem da capoeira, baseando-se em Rego (1968), podemos falar de tal origem levando em consideração o triângulo sangrento: invasão, colonização e necessidade de mão-de-obra. Tudo começou quando Portugal, em 1.500, resolveu invadir as terras localizadas abaixo do equador. Uma vez invadidas as terras brasileiras, consequentemente, estas foram colonizadas e, para ser efetivada esta coloniza- ção do Brasil, fez-se "algumas" pessoas se submeterem a trabalhos forçados. Dentre estas pessoas estavam os índios e os negros. Os índios, que eram os verdadeiros donos das terras brasileiras, levaram a fama de "péssima mão-deobra" e, os negros, que foram seqüestrados do continente africano, levaram, e ainda levam, a fama de malandro, desordeiro, preguiçoso, enfim, tudo que tiver um sentido pejorativo (como podemos observar, o regime escravocrata no Brasil, também promoveu o preconceito racial e, ao contrário do que Genovese (1988) afirma, talvez este preconceito racial, seja ou foi na mesma intensidade que nos E. U. A., apenas alguns fatores, que levaram a tal preconceito, possam ter sido desenvolvidos de formas diferentes). "Argumenta-se que a sobrevivência das primeiras engenhocas, o plantio de cana-de-açúcar, do algodão, do café e do fumo foram os elementos decisivos, para que a metrópole enviasse para o Brasil os primeiros escravos africanos. Diante disso, vem a pergunta: quando chegaram os primeiros escravos? Vieram de Angola? Trouxeram de lá a capoeira ou inventaram-na no Brasil?" (Rego 1968, p. 9). A citação acima ilustra questões tipicamente pertencentes ao contexto sócio-cultural afro-brasileiro, mais especificamente baiano, ou seja, a capoeira angola, que é considerada a tradicional e mais ligada às origens, só poderia originar-se porque a situação pela qual os negros estavam passando, exigia alguma forma de luta e, como nos informa Moore (1987), à respeito das três qualidades ou capacidades humanas que poderiam adicionar alguma "energia na alma" (coragem moral, capacidade intelectual e inventividade moral), poderíamos incluir a capoeira principalmente na terceira, pois os escravos criaram, a partir das tradições culturais vigentes, padrões historicamente novos de condenação ao que existia. Rego (1968), por sua vez, atribui às tendências para festa, à fertilidade de imaginação e à agilidade, somado às coisas do cotidiano, o fato de usarem e abusarem dos folguedos já conhecidos e inventarem outros, como é o caso da capoeira. Este autor ainda chama a atenção para uma outra questão: a dificuldade em realizar um estudo preciso sobre a escravidão negra no Brasil, pois o Ministro da Fazenda do governo Deodoro da Fonseca (1.890), Rui Barbosa, havia mandado queimar todas as documentações referentes à escravidão negra no Brasil, desta forma, faz-se com que algumas suposições em qualquer estudo histórico sobre tal assunto sejam sempre levantadas e, como se isso não bastasse, outra dificuldade surge também, isto é, lidar com os pressupostos ideológicos contidos na historiografia do Brasil sobre o escravo e a escravidão, que privilegiam a legitimação da sociedade escravista. Sendo assim, podemos perceber, por exemplo, ser impossível precisar a chegada dos primeiros escravos no Brasil. "Fala-se que em 1.538 Jorge Lopes Bixorda, arrendatário de paubrasil, teria traficado para a Bahia os primeiros escravos africanos (Rego 1968, p. 10)." Diz-se que a maior parte dos escravos teriam vindo de Angola (o centro mais importante da época) e estes, por sua vez, também teriam sido os primeiros a chegarem no Brasil. Angola tinha fama de possuir bons escravos, haja vista que eram considerados submissos, o que facilitava a relação senhor - escravo. Isto nos faz lembrar a questão dos escravos do Velho Sul dos E. U. A., os quais eram caracterizados como submissos ao paternalismo sulista tratado por Genovese (1988). A partir disso poderíamos questionar: Os escravos do Velho Sul, teriam vindo de que lugar da África? E, de uma forma meio irônica: teriam vindo de Angola?, ou melhor, que situações os escravos viviam para que os considerassem submissos e que comportamento era considerado submissão? Suposições a parte, o relevante no momento é tratar de questões referentes à religião (influência do cristianismo sobre os valores africanos) e, vale ressaltar que estará presente o ponto que podemos considerar crucial para o desenvolvimento da análise comparativa entre Genovese (1988) e Rego (1968): o tema relativo à luta e à submissão dos negros.

RELIGIÃO AFRICANA X CRISTIANISMO

"Parece, no mínimo, teológicamente duvidoso um Deus cristão pedir a alguém para se responsabilizar por almas alheias. Mas estão implícitos nesta colocação tão difundida os temas do dever e do fardo, que embora atendendo a interesses próprios, e embora frustrantes, foram a pedra sobre a qual se apoiaram, necessariamente, a ideologia, a moralidade e auto-imagem dos senhores de escravos". (Genovese 1988, p. 118) Partindo do pressuposto de que o cristianismo contribuiu grandemente para a hegemonia do regime escravocrata, a partir da citação acima, pode-se notar que os preceitos teológicos utilizados por tal regime promoveram "algumas" conseqüências, e dentre elas estão as relacionadas ao comportamento dos negros, quer seja na situação de escravos, quer seja na situação de libertos. Além disso, tanto no Brasil como nos E. U. A., essas conseqüências podem ser verificadas. Rego (1968), baseado em Calógeras (1927), o qual remexeu o bulário português nos arquivos da Torre do Tombo, demonstra que o comércio dos escravos, bem como as conquistas de terras eram incentivadas pela maioria das bulas papais. Somente alguns poucos papas protestaram contra a escravidão de negros. Diante deste quadro, não é de se esperar que uma grande parcela de senhores de escravos, "fervorosos cristãos", fossem a favor da religião dos escravos, e não é nem tanto pela diferença entre as mesmas no que diz respeito a ritual, crenças etc. Segundo Genovese (1988), a religião dos escravos, à medida que promovia nos negros uma certa autonomia psicológica e cultural, consequentemente estimulava a resistência. Daí o interesse dos senhores em conseguir que os escravos sofressem a influência dos preceitos da ideologia cristã, sendo esta disfarçada em algo benéfico, que de certa forma "acalantaria os espíritos de seus escravos" e, consequentemente os tornariam submissos ao sistema escravocrata. Um bom exemplo de conseqüência da ideologia cristã com intuito de conduzir o negro a ser submisso, e que também pode ser observado em Genovese (1988), encontra-se em sua referência aos spirituals, os quais apelavam ao castigo e, quanto mais apelavam, menos falavam em vingança. No Brasil, a religião africana parece ter dado o estímulo necessário para que se criasse algo específico como resistência: a capoeira. Apesar de Rego (1968) afirmar ser a capoeira e o candomblé, um independente do outro, na sua própria obra pode-se notar grandes influências do candomblé sobre os negros, inclusive nos capoeiristas que ele cita: "É o capoeira que é omorixá (filho de santo), como é o caso do capoeira Arnol (Arnol da Conceição) que é filho de santo do famoso babalorixá (pai de santo) de Cachoeira, conhecido por Enock (Enock Cardoso dos Santos), o qual fez Oxóssi (Odé) em sua cabeça, dando o orukó (nome) de Odé Ajayi Koleji (O caçador de Ajayi não pode acordar). (...) Quando não é isso, é oloyê (dono de título honorífico) de uma casa de candomblé, é parente de mãe de santo ou pai de santo, ou foi desde criança criado em ambiente de casa de candomblé." (Rego 1968, p. 38) Mas não só era a religião africana que estimulava a coragem nos negros para resistir, em meio a tanta influência do cristianismo, acabou havendo um sincretismo afro-cristão. Ainda em discursos de mestres de capoeira do iní- cio deste século, pode-se verificar tal sincretismo quando estes falam da questão de se proteger contra os males provocados por algum feitiço ou se proteger dos perigos provenientes de uma luta e, para ficar com o "corpo fechado" (protegido dos males) faz-se orações que acabam evocando santos do cristianismo e orixás do candomblé, ou então fazem orações evocando santos cristãos mas com a crença em alguma "superstição" africana. É o caso de mestre Cobrinha Verde que recomendava algumas ora- ções fortes como a seguinte: "Valei-me meu São Silvestre e os anjos 27 pela sua camisa que veste Assim como São Silvestre abrandou os corações dos três leões, em cima do morro cravado de pé e mão. Abrandai eles debaixo do meu pé esquecidos, mais mansos do que a cera branca Se olhos tragam, não me enxergarão Se boca tragam, não me falarão Se pagam para mim, não me alcançarão Se faca tragam para mim, é de se enrolar como Nossa Senhora enrolou o Arco Celeste. Cacete para mim é de ser quebrado, assim como Nossa Senhora quebrou os gravetinhos para ferver o leite de seu Bendito Filho. Arma de fogo para mim apontada é de correr água pelo cano, sangue pelo gatilho, assim como Nossa Senhora chorou lágrimas pelo seu Bendito Filho. Amém." (Mestre Cobrinha Verde Apud Santos, M.) Essa forma de "proteção interior", adquirida através de orações, foi herdada da cultura africana e faz parte da mandinga (feitiço ou bruxaria). Segundo Costa (1993), a mandinga, como um dos "preceitos" da capoeira, talvez seja sua arma mais poderosa, pois tem um significado de luta oculta. Inclusive, atualmente, no meio capoeirístico, utiliza-se a expressão "mandiguêro" para se referir a um bom capoeirista, ou então, referir-se ao tipo de jogo ijogo mandiguêro). Tanto o cristianismo herdado pelos escravos afro-americanos (o protestante), quanto o cristianismo dos escravos afro-brasileiros, para poder se firmar como religião dos escravos, teve de se africanizar. O próprio Genovese (1988) quando trata à respeito da religião dos escravos sulistas enquanto algo que envolve a relação existente entre religião e resistência, ou acomodação, examina também a situação do Brasil e se refere aos cultos religiosos afro-brasileiros como algo mais autônomo, haja vista que no Brasil, ao contrário dos E. U. A., era grande o número de negros, mestiços e índios em relação ao nú- mero de brancos. É verdade que no Brasil de hoje há muitos cultos afro-religiosos com grande força e amplitude, o que não é o mesmo com relação aos E. U. A. E, se analisássemos somente a Bahia, já teríamos um enorme acervo de informações sobre o sincretismo afro-cató- lico. Enfim, vale a pena considerar que todo cuidado é pouco ao pensar que a religião estimulou os escravos à rebelião ou então que os tornou dóceis, mas, por outro lado, tanto Genovese (1988) como Rego (1968) não deveriam afirmar: o primeiro, que "não é muito ní- tida a contribuição da religião à insurreição dos escravos" e, o segundo, que "a capoeira é independente do candomblé", pois, tanto um como o outro, em suas obras demonstram uma certa ligação entre a questão religiosa e os fatores luta ou submissão. Quando Rego (1968) fala sobre a indumentária utilizada na capoeira, acaba se referindo a certos costumes, inclusive religiosos, que influenciavam a maneira de se vestir dos negros. Por exemplo, um ogan (título honorífico num candomblé) é obrigado a utilizar vestes totalmente brancas, o mesmo ocorre se o negro for participar do axexê (ritual fúnebre) ou de festas de Oxalá. Como foi narrado anteriormente, muitos capoeiristas eram ligados ao candomblé e,,com relação a roupa branca utilizada durante o jogo de capoeira, muitas vezes estes estavam cumprindo com algum dever religioso africano. Antes de finalizar esta parte do texto é importante salientar o papel da mulher inserido na tradição religiosa africana. Diferentemente do que o cristianismo preconizou como nos informa Genovese (1988), ou seja, a estrita submissão das mulheres aos homens influenciada pela força política exercida na família patriarcal, no filme Dança de Guerra (Gerbasi) é demonstrado justamente o contrário, apesar de que, num primeiro momento, ao assistir as mulheres1 participando de um ritual capoeirístico (fazendo rezas, batendo palmas e cantando, muitas vezes sorrindo, expressando prazer ao assistir o jogo, ou ao ouvir o mestre tocar berimbau) sem propriamente jogar a capoeira, poderia nos fazer chegar a conclusão de submissão das mulheres com relação aos homens mas, na verdade, a posição que a mulher exercia neste ritual era superior, isto é, para que tudo corresse bem, havia a dependência da força de suas orações, inclusive os capoeiristas pediam conselhos às mães de santo e não tomavam uma decisão sem consultá-las2 . A partir daí, podese notar a força do matriarcado africano presente na cultura afro-brasileira.3 Diante do exposto anteriormente, o que se pode afirmar talvez, é que a questão relativa à submissão ou à luta (independente de serem os "escravos" abordados em Genovese ou os capoeiristas abordados em Rego), não dá para ser um fato isolado da dimensão espiritual inserida nas ideologias ou valores, tanto africanos como cristãos. Nada teria existido como existiu, e como existe até hoje, se não sofresse mesmo influência de valores diversos, tudo isso fazia ou faz parte do repertório da vida de qualquer pessoa, tenha sido ela escravo, senhor, branco ou negro, seja ela patrão, assalariado, adulto ou criança. Todos "foram" e "são" responsáveis, não só pelo "mundo que os escravos criaram", e sim pelo "mundo que é criado".

CAPOEIRA E ESCRAVIDÃO: RESISTÊNCIA OU ACOMODAÇÃO?

Em meio a essa mistura de raças e de culturas, vimos a influência do cristianismo e, tanto em Genovese (1988) como em Rego (1968) observamos que o cristianismo era uma das formas de "dominação". Ao refletirmos sobre esta palavra chegaremos a dois pontos extremos, porém, coexistentes. Primeiro, se alguém é dominado é porque existe submissão e, segundo, se alguém luta é porque há domina- ção. Mas por que iniciar este parágrafo fazendo referência ao cristianismo? As crenças, em geral, eram uma forma de os escravos se sentirem confiantes na vitória, era uma força para a luta e, até o cristianismo, como se pode observar em Genovese (1988), era algo que tornava os escravos submissos à escravidão mas, por outro lado, promovia a resistência dos escravos. O próprio folclore é fonte de dados que dão sinais de resistência e ambos os autores estão de acordo com isso. As cantigas de capoeira, por exemplo, retratam cenas da vida patriarcal brasileira possibilitando uma remontagem dos primórdios da colonização pois, muitas vezes são narrados fatos da vida cotidiana do negro livre ou do negro na senzala. A que vem a seguir demonstra uma forma de resistência a partir da valentia do negro: "Dá, dá, dá no nêgo Mas no nego você não dá Esse nêgo é valente Ele qué me mata Dá, dá, dá no nêgo Ô no nêgo você não dá Esse nêgo é valente Esse nêego é danado Esse nêgo é o cão" Um acontecimento de grande relevância na vida do capoeirista foi a guerra do Paraguai, também muito expressado em cantigas. Os capoeiristas nesta época entraram em grande conflito com a força pública e a sociedade. Em Genovese (1988), também é demonstrada uma situação semelhante referente aos negros escravos de São Domingos que, lutando pela liberdade, derrotaram seus senhores brancos e ainda as tropas francesas que tinham o objetivo de combatê-los. Após este episódio, viram a bravura com que os negros lutavam e observou-se, então, que não era necessário muito treino. Mas será que realmente os negros não treinavam? O que pode-se observar em Rego é que os escravos treinavam, e tinham todo um macete para disfarçar suas proezas. A capoeira era jogada, era divertimento, mas era luta também e servia como treinamento, mas é claro que, na presença súbita de algum branco eles disfarçavam a sua poderosa arma em brincadeira ou dança. Enfim, os capoeiristas representavam perigo para a classe dominante, eles afrontavam a força pública e só se entregavam "mortos" ou "quase mortos". Por este motivo, a legislação passou a puni-los. A polícia, munida de instrumento jurídico, tinha ordem de massacrar os capoeiristas. Genovese (1988), ao abordar sobre a questão hegemônica do direito também esboça que os escravos entendiam que a lei lhes proporcionavam pouca ou nenhuma proteção e, os escravos, conseqüentemente, recorriam, ou a seus próprios senhores se fossem bons, ou aos senhores vizinhos, caso contrário, para conseguir proteção. Os escravos do Brasil, além da capoeira, como forma de defesa, também tinham "quilombos", para os quais eles fugiam e, o próprio Genovese (1988), baseado em Freyre, se reporta à capoeira e também ao Quilombo dos Palmares. Entretanto, as façanhas dos negros capoeiristas também serviram o poder público, inclusive em campanhas políticas. Isto, de certa forma, foi um tipo de acomodação. O que aconteceu e acontece com os negros, tanto do Brasil como os dos EUA, acarreta uma mescla de acomodação e resistência simultaneamente. A estratégia de repressão utilizada pela classe dominante provoca a situação de acomodação, mas, por outro lado, devido ao sofrimento excessivo causado por essa mesma repressão, cria-se também uma necessidade de luta. Diante deste "impasse" originário de várias formas de pressão psicológica (a escravidão é um exemplo) por parte da classe dominante, não poderíamos esperar que houvesse a predominância de insurreições ou qualquer tipo de movimento de resistência, pois, os oprimidos, até os dias atuais são induzidos a um sentimento de inferioridade e de servidão, surgido muitas vezes de preconceitos raciais, ideológicos, culturais etc. que tiram a coragem e a força dos oprimidos. E o que fazer com as injustiças? São tantos "seres humanos" neste mundo e, consecutivamente, são tantos interesses diversos que até os mais fortes e mais justos têm seus momentos de crise e de fraqueza.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COSTA, R. S. Capoeira: o caminho para o berimbau. Brasília: Thesaurus, 1993.
GENOVESE, E. A terra prometida: o mundo que os escravos criaram. São Paulo: Paz e Terra, 1988.
GERBASI, S. Dança de Guerra, (s. L: s.n.), (19- ?). 1 filme MOORE, B. Jr. Injustiça: As bases da obediência e da revolta. São Paulo: Brasiliense, 1987.
REGO, W. Capoeira Angola: ensaio sócioetnográfico. Bahia: Itapuã, 1968.
SANTOS, M. Capoeira e Mandingas: Cobrinha Verde. Salvador: A Rasteira, 1991.
SIMÕES, R. M. A. Capoeira: um convite ao jogo feminino. Rio Claro: UNESP, 1999. (Disserta- ção de Mestrado). 142p.
SODRE, M. O terreiro e a cidade: a forma social negro-brasileira. Petrópolis: Vozes, 1988.165p.





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